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Na última semana da vela eu estava hospedado no veleiro Petit Prince, no Iate Clube de Ilhabela.
Aportados à um resistente cais flutuante de concreto e ferro, amarrados com quatro cabos (duas espias e dois springs) pensavamos estar seguros, mas na madrugada de sábado para domingo entrou derrepente um vento sul no canal da ilha de cerca de 50 nós (94km/h) e arrebentou nossas amarras, tamanha sua força. Veleiros começaram a se bater devido ao vento e as ondas, acordamos com os barulhos que vinham de toda parte, quando eu me levantei, o Paulo ja estava no convés ligando o motor para empulsinar o barco contra o vento e ao redor parecia o fim do mundo. Barcos desgovernados passavam por fora do anel do cais, perdidos de suas âncoras e tantos outros tripulados se escondiam atrás de enormes petroleiros para não sofrer a ação do vento. Com o rádio ligado no canal de comunicação do Iate Clube Ilha Bela ouviamos diversos pedidos de ajuda e impotentes, respondiamos que nada poderiamos fazer para ajuda-los e os aconselhavamos que se escondessem atrás dos petroleiros. Após 30 minutos de tormenta vimos a enorme embarcação da Marinha, que participa dos festejos da regata, dirigir-se no sentido dos barcos que pediam socorro e isso nos deu um alívio. À nós, restava cuidar do nosso próprio problema, tinhamos que nos amarrar novamente ao cais e ao nosso redor haviam algumas dezenas de veleiros. Com motor a frente e sem sair do lugar, depois de 40 minutos de luta, conseguimos nos amarrar com quatro espias na proa, ou seja, quatro cabos no mesmo sentido para frente, afim de manter o barco alinhado com o vento e as ondas, diminuindo assim o perfil do veleiro cotra suas forças. Ao nosso lado uma lancha não teve tanta sorte, golpeada com onda atrás de onda, acabou por afundar. Tentamos socorrer a lancha, mas devido ao nosso apuro, quando nos demos conta a embarcação ja tinha afundado sem tripulação, isso se deu em questão de minutos e foi uma terrivel surpresa. Em um instante ela estava ali agonizando e no outro ela tinha desaparecido, nem a vimos afundar mas viamos suas amarras ainda no cais.
Depois disso nos restava dormir, mas quem iria conseguir dormir depois daquela dose de adrenalina tremenda e o medo de uma nova surpresa? No final das contas acabei ficando sozinho no barco, o Paulo tinha pulado na água para alcançar o cais e la ele fez as amarras enquanto eu fazia o mesmo no veleiro e depois de feito, ele achou mais seguro dormir no salão do Iate Clube, o que me fez um tripulante mais assustado afinal, sozinho era melhor que nada mais desse errado e também por isso não consegui mais dormir, apenas fiquei deitado com o rádio ligado por mais um tempo ouvindo os pedidos de ajuda e os relatos de ventos nos medidores dos barcos em mar “Estou registrando 48 nós de vento e nas rajadas chegam a quase 60″ afirmou um velejador em mar.

Cais de concreto um dia antes da tempestade fotografado por Paulo Vinicius Arruda Passos
No dia seguinte, com muito sol e muito vento seguimos para o Bracuhy em Angra dos Reis, fizemos o trajeto em 11 horas com vento de popa de 20 a 25 nós, três velas abertas e muitas ondas que pareciam paredes de água atrás de nós, ja que estavamos no mesmo sentidos delas, foi o dia de vela mais trabalhoso que ja tive, mas foi um velejo para guardar na memória.